4 de mai. de 2009

Ambiente adequado

Não é que eu seja contra a natureza. Pelo contrário, sou a favor da total preservação dela. Tanto que acredito que os humanos deveriam se manter o mais afastado possível de qualquer vestígio natural. Aproveitando o conselho de Luis Fernando Veríssimo, o mais próximo que chego perto da vida selvagem hoje é usar bermudas e, de preferência, longas.

Já Karmem era entusiasta dos passeios ao ar livre e no meio do matagal.

- Não é ótimo sentir a conexão com a mãe-natureza?

Por 'mãe-natureza', entenda mato, picada de insetos e total falta de saneamento.

- Karmem, aqui não é adequado para seres humanos.

- E por quê não? Sinta o ar puro entrando nos seus pulmões. Livre-se das preocupações da vida agitada e entre em sintonia com o cosmos, meu querido.

A única sintonia que entrava em mim nessas ocasiões eram os ferrões de insetos.

- Ah, como eu gostaria de morar no meio da selva!

- Longe de comida preparada com a higiene necessária, toaletes com assepsia adequada e proteção contra os animais, isso sem falar de malária, dengue e outras doenças?

- Isso.

Vai entender a mente de Karmem: seu maior desejo era abdicar dos perigos da vida moderna para levar um dia-a-dia recheado de contatos com as raízes.

Resumindo: ela preferiria, por exemplo, se arriscar a ser picada por uma naturalíssima cobra e estar a léguas de distância de qualquer hospital disponível para eliminar a possibilidade de ser envenenada aos poucos pelos corantes e conservantes da indústria de alimentos.

- Karmem, aqui não tem corrimão, aliás, não tem nem degraus. Tem certeza de que a trilha é aqui?

- Claro que tenho! Bom, está um pouco mais fechada do que de costume, mas, olha, vai abrindo o caminho com isso aqui.

E me entregou sua lixa de unhas.

- Quando a gente chegar na cachoeira você vai agradecer por eu ter pensado nesse passeio. A vista de lá compensa tudo!

Karmem ia cantarolando atrás de mim, com borboletas bailando alegremente sobre sua cabeça e pintassilgos entoando um canto de boas-vindas enquanto eu abria o caminho com a lixa de unha, por uma trilha cuja existência antes de nossa passagem por ali eu nunca pude comprovar.

Os espinhos das plantas arranhavam meu braço, meu rosto e minhas pernas, mas abria a via para que a namorada prosseguisse sem se machucar.

- Criatura, você tem certeza de que é para esse lado?

- Claro! Siga em frente, a cachoeira não pode estar longe.

- Eu não estou ouvindo barulho nenhum de água corrente.

- Ai, como você é surdo! Está para lá, eu estou até sentindo um frescorzinho vindo daí da frente.

- É do garrafão de água gelada que eu estou carregando dentro da mochila...

- Ah, é? Então segura mais para a direita, que está desnivelado.

Minha única proteção contra a artilharia aérea da natureza (leia-se: mosquitos, borrachudos, moriçocas, pernilongos, zangões e abelhas) era um incenso gigante de citronela. Comprei um de mais de meio metro de comprimento e ia balançando na minha frente, espantando tantos animais com a fumaça que o desequilíbrio ecológico nunca conseguiu se restabelecer.

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