15 de abr. de 2009

Limites

Carlos Charles aguentou até que razoavelmente bem.

Não falou nada sobre a mania de torcer seus mamilos do candidato a namorado.

Nem do cheiro de naftalina da roupa.

Muito menos das manchas de catchup no sofá, do uso indiscriminado do seu condicionador de leite de avelãs, dos riscos no DVD da Kylie Minogue, nem do espelho quebrado por um golpe de escova de cabelo mal manuseada.

Mas tudo tem um limite.

Começou no supermercado.

- Vamos levar sorvete, Carlos?

- Aham.

- Melhor napolitano, né? Assim, já vem três sabores em um.

- Não tem nenhum de napolitano aqui.

- Tem sim, olha ali.

- Aquele não é o verdadeiro.

- Como assim, verdadeiro?

- O real sorvete napolitano vem com os sabores de morango e chocolate intermediados por uma camada de sorvete de nata, não de creme.

- E qual a diferença?

- Faz toda a diferença, a começar pela cor. O sabor nata é mais clarinho e tem um sabor suave. Não tem essa baunilha gritando na minha língua.

- E baunilha grita?

Carlos Charles concordou em levar o tenebroso napolitano pirata com o sabor creme mesmo. Foi prontamente servido em casa pelo rapaz.

- Quer mais?

- Não, já está bom. Obrigado.

- Então vou guardar no freezer.

- O que você está fazendo?

- Ué, estou fechando a tampa do pote.

- Isso eu vi, mas você não percebe que está errado?

- Errado, como?

- Você está invertendo a tampa!

- Não estou, o lado de cima está para cima...

- O lado da tampa que cobria o morango está agora em cima do chocolate!

- E daí?

- Daí que vai deixar os resquícios de morango em cima do chocolate e vice-versa.

- Ai, qual o problema, Carlos?

- O problema é que eu gosto de ter cada um estimulando separadamente o meu paladar.

- Na barriga mistura tudo.

- Então da próxima vez você bate bife, arroz, salsicha e Qi-Suco junto com o sorvete no liquidificador e toma tudo de uma vez. Mas faz isso na sua casa, não na minha.

Tampa de napolitano invertida definitivamente era demais para Carlos Charles.

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