23 de jul. de 2009

Teste de paciência

Karmem chegou com uma revista.

- Olha só, aqui tem um teste de personalidade que a minha chefe disse que é batata!

Pensei em perguntar se o teste ficava bom esmagado com creme de leite, ou se daria para assá-lo e recheá-lo com requeijão e bacon, mas preferi apenas concordar com a cabeça.

- Eu vou pedir algumas palavras e você me diz a primeira que vier na sua cabeça. Combinado?

As maiores discussões com Karmem geralmente apareciam depois de termos combinado qualquer coisa.

- Diga uma letra.

- Ah?

- Isso. Agora, me diga uma palavra de quatro letras.

- Três?

- Não, três não, quatro. Quatro letras.

- Então, a palavra “três” tem quatro letras.

Karmem escreveu a palavra no canto da página da revista, como tinha feito com o “A” da primeira pergunta e contou quantas letras tinha.

- Certo. Agora, uma de cinco.

- Cinco.

- Isso, de cinco letras.

- Então, “cinco”.

- Cinco? Essa é a sua palavra?

- Ué, cinco tem cinco letras. Será que é por isso que se chama cinco?

- Não sei, só sei que isso está muito esquisito. Diga agora uma palavra de seis letras.

- Quatro.

- Como, quatro? O teste pede uma de seis letras!

- Então, a palavra “quatro” tem seis letras...

- Você está tentando me irritar? Por que, se estiver, está conseguindo. Fala uma palavra de duas letras.

- Um.

- Uma de três letras.

- Uma.

Karmem suspirou tão fundo que uma frente fria da Argentina que estava na cidade subitamente desapareceu antes de me fazer a pergunta fatal, a que eu nunca soube responder, embora ela quisesse a resposta mais genial de minha parte:

- O que você está querendo me dizer?

- As primeiras palavras que vieram na minha cabeça, como você pediu. O que foi que você colocou quando fez o teste?

- Para qual item?

- O de uma letra.

- E.

- E o de duas letras?

- Eu.

- Sim, você. O que colocou na parte que pede uma palavra de duas...

- Então, eu coloquei “eu”.

- E na de três?

- Bom, primeiro eu coloquei “meu”, depois, troquei para “mim”.

- E na de quatro?

- “Tudo”. Aí voltei na pergunta de três letras e troquei de volta para “meu”.

- E na de cinco?

- Minha...

Fiquei até com medo de perguntar, mas fui em frente.

- E na de seis?

- Minhas... Mas você nem me deixou fazer a última pergunta.

- E qual é?

- Você tem que montar uma frase com a maioria das palavras que utilizou...

- Cinco, quatro, três, dois, um!

- Essa é a sua frase?

- Sim. Por quê, tinha que ser uma oração, com sujeito e predicado?

- Não sei, aqui na revista só pede uma frase. Mas é que agora eu ia dizer que as palavras não importam tanto, e sim a frase que você forma.

- Poxa, então, pela minha frase, acho que eu tenho aptidões para trabalhar na Nasa, não acha?

- Exatamente. Acho que você tem aptidão para sair desse planeta, isso sim.

- E que frase você formou no seu teste?

- “É tudo meu”...

15 de jul. de 2009

Recado - Revista Young

Pessoal,

Uma amiga acaba de lançar uma revista focada em gente jovem, e a editora me convidou para fazer uma colaboração no próximo número.

A primeira edição pode ser conferida aqui: Revista Young.

São dicas de viagem, de música, de saúde, de carreira, cujo foco são pessoas ali na casa dos vinte e poucos anos, mas que funcionam muito bem para todos nós (principalmente os que mantêm o espírito jovem).


Assim que a segunda estiver pronta eu posto aqui, combinado?

Abração!

1 de jul. de 2009

Solidão

Ouvir Karmem sobre todos os seus problemas sempre foi uma tarefa que eu desempenhava com muito carinho. Mas às vezes confesso que era difícil compreender toda a complexidade de algumas situações.

- Hoje foi um dia muito ruim para mim.

- Por que, coração?

- Imagine que de manhã eu acordei e pensei que ninguém no mundo gosta de mim.

- Que injustiça! Eu gosto muito de você.

- Você não conta.

- E quem conta?

- Ah, todo o resto!

- E a sua família?

- Só me trataram com desprezo quando desci para tomar o café.

- Jura?

- Sim. Meu pai buscou pãezinhos frescos na padaria, passou manteiga para mim e ainda me comprou um pão-doce de coco, o meu preferido.

- Isso é tratar com desprezo?

- Claro que é! Ele sabe que estou de regime.

- Entendo...

- Mas o pior foi durante o trabalho. Eu entrei na sala, disse ‘bom dia pessoal! Chega de tristeza, pois eu cheguei para alegrar o ambiente’ e sabe o que as pessoas responderam?

- O quê?

- ‘Bom dia’! Assim, sem nem elaborar a resposta!

- E como eles deviam responder?

- Se eu soubesse, teria dito a eles ontem, né?

- Acho que sim...

- Aí, como fiquei super chateada com isso, decidi não convidar ninguém para almoçar comigo. Peguei meu livro da bolsa e fui para a porta, decidida a refletir sobre a minha solidão e como não sou querida do jeito que mereço.

- Mas quando eu liguei pro seu celular você parecia rodeada de gente.

- Justamente. As pessoas me viram saindo e foram almoçar comigo, me perseguindo até o refeitório. Não me deixaram sozinha um só minuto.

- E você está reclamando disso?

- Claro. Estragaram a solidão que eu já havia planejado passar na hora do almoço. Não se pode nem mais ficar deprimida em paz nessa vida!